Quando desistir é a melhor opção
Do que a gente precisa desistir para abrir espaço para o que mais importa?
No começo do ano, fiz um mapa dos sonhos, que consiste, basicamente, em escrever no papel seus desejos como se eles já tivessem acontecido. Em vez de dizer "no futuro, vou morar numa casa incrível", você escreve "estou aqui na minha casa, que é do jeito que sonhei: ampla, com uma vista linda para o pôr do sol, com três quartos, um papel de parede deslumbrante no meio da sala". Foi a Bianca Boca Rosa que falou disso um dia. Resolvi fazer e adorei colocar intenção em tudo o que me importa.
Entre os tópicos, estava estudar. Já compartilhei em outros textos na Contente que faz tempo que eu não estudo formalmente. Sempre fui muito da prática, do fazer, de colocar a mão na massa. Adoro esse lado meu, mas acabo sentindo falta de estimular meu cérebro com outras atividades também.
Decidi que neste ano eu entraria numa pós-graduação. Uma característica minha é: quando coloco algo na cabeça, quero que aconteça logo. Sou ariana e nasci de 8 meses, o que acho uma explicação que já entrega tudo, rs.
Comecei a olhar algumas possibilidades. Pra começar, uma dificuldade: o que eu quero estudar? Tenho tantos interesses que, quase sempre, fica difícil focar. É, realmente, a dor e a delícia de ser quem eu sou. Por um lado, que massa, mas, por outro, nesse mundo que valoriza tanto os especialistas, será que eu não acabo perdendo espaço também? Entre os temas que olhei, estavam criatividade, direitos humanos, ESG, marketing e branding.
Fiquei pensando: bora estudar algo que eu consiga aplicar diretamente na Contente. Afinal, se eu posso estudar e, ainda, contribuir para a empresa, por que não?
Ainda não estava muito segura, mas tinha pressa. Queria resolver logo.
Laura, minha mulher, cantou a bola. Será que você vai gostar de fazer algo online? Por que não procura algo presencial? Quem sabe até algum curso ou experiência fora do país?
Não, queria logo. Queria parar de sentir o incômodo de ter ficado desde a faculdade sem fazer um curso formal. Me inscrevi numanma pós-graduação em marketing, branding e growth. Online. Uma amiga estava fazendo, tinha gostado. Outra ia se inscrever na mesma instituição, que é renomada.
E lá fui eu encaixar os estudos na minha agenda, que já é um Tetris na vida real. Inicialmente, reservei duas horas por dia para estudar. De novo, quando eu coloco alguma coisa na cabeça, já viu… Fazia isso na hora do almoço, estava ali tentando me animar.
Depois de umas semanas, percebi que esse tanto de tempo seria impossível. Diminui para duas vezes por semana, um tempinho no fim de semana também.
Ainda assim, tava difícil dar conta. Foi quando comecei a me perguntar: tá difícil porque realmente o tempo tá curto, ou porque tá chato? Eu coloco o professor para falar na velocidade 1.5x porque quero dar conta de tanto tempo de vídeo, ou porque é algo que não tá despertando meu interesse?
Fiquei um tempo com esse incômodo. Não tinha tesão em fazer as aulas, tampouco em contar para os outros o que eu estava estudando. E isso, pra mim, é sinal de alerta. Quando a gente gosta é claro que a gente compartilha, rs. Eu, ainda por cima, parece que só sei existir assim. Desde quando eu tinha blog e pre-ci-sa-va mostrar aquela música nova, falar da peça de teatro que fui, do filme que vi. Mas, mais que isso, porque sou do tipo que acredita que, ao aprender algo que nos desperta, a gente ganha ao dividir com mais gente.
As semanas foram passando, e nada. Até o momento em que um novo desafio profissional foi se aproximando, o tempo encurtando e eu, surtando. Eu ia dar aulas numa pós-graduação em escrita criativa e produção de conteúdo na Cesar School, escola do Porto Digital, do Recife. Eram muitas horas de aula, e eu entrei em pânico pensando se eu daria conta de tal façanha. Quando olhava minha agenda, lá estava o tempo dedicado aos estudos. Como eu ia fazer caber a preparação das aulas nessa agenda, que também inclui trabalho, maternidade, criação de conteúdo, exercício, lazer?
Foi quando eu percebi que não dava mais. Por que eu ia continuar, se não estava aprendendo coisas novas, que me estimulassem?
Mandei áudio pra umas amigas compartilhando as sensações. Eu queria continuar, afinal que tipo de pessoa sou eu que quer desistir em dois meses de curso? O que isso diz sobre meu comprometimento? Uma delas falou: nada a ver essa pós, cancela hoje mesmo. A outra falou: estudar é um valor pra você, só que você não sente que está conquistando algo com isso. Desiste, mas não deixa de procurar algo que faça sentido pra você.
Cancelei a matrícula – e ainda fiquei "feliz" com o estorno parcial no cartão de crédito. Parei de me obrigar a sentar a bunda na cadeira para consumir um conteúdo que só estava fazendo ruído na minha cabeça.
Entendi que não consigo, neste momento, estudar online e assíncronamente. Eu preciso da troca, eu preciso estar com outras pessoas para me sentir em comunidade. Eu quero aquela sensação da mente se expandindo, da empolgação que vem quando a gente percebe que não só está aprendendo como está trocando com mais gente. Eu nunca gostei de nada morno, como é que eu ia achar que conseguiria fazer uma pós só para constar?
Eu quero estudar com estímulo, quero o brilho no olho. Quero a imersão. Quero o presencial. Não dá para ter uma vida inteira nas telas. Quero mais do que isso.
Ainda não contei para minha tia que desisti. Ela, que desde sempre ressaltou a importância de ser manter estudando, vibrou de maneira quase inédita quando falei que ia começar a pós. Bichinha, vai ficar decepcionada*. Mas tem decepção maior do que gastar tempo com o que não acrescenta?
Quando desisti da pós, abri espaço para preparar as aulas. Semana passada, dei as quatro primeiras. De novo, não sem antes quase surtar. Mas sabe o que foi foda? Quando comecei, tudo fluiu. Consegui dividir o que sei, consegui propor exercícios que me fizeram ouvir que a aula parecia uma sessão de terapia, consegui criar um campo de trocas com os alunos, que são maravilhosos. Era online, mas era ao vivo, e isso fez muita diferença, eu imagino. Até para eu entender que posso estudar nessa modalidade também. Mas ouvindo aula gravada, ah, não…
Às vezes a gente desiste de uma obrigação para abrir espaço para uma vocação. Ou para qualquer outra coisa. Até mesmo para o tempo livre pra gente olhar pro teto e começar a pensar no que faz sentido de verdade.
Sei que vou achar uma pós ou um curso que traga tudo isso pra mim. Quero. Porque, como disse minha amiga, isso é um valor pra mim. E, se eu demorar mais pra criar espaço pra essa área da vida, grandes chances de eu me frustrar mais adiante. Mas que seja com sentido, com propósito, e não só para constar.
Pra terminar, eu te pergunto: será que tem algo na sua vida de que você precisa desistir para abrir mais espaço para você?
* E não é que eu contei pra ela e ela falou: eu bem que desconfiei, você nunca mais tinha falado da pós? E ainda tivemos um papo sobre as dificuldades da aprendizagem nesses tempos tão acelerados. Foi um alívio!
Essa edição foi mais do que necessária para mim! Tenho o seguinte mantra de vida: siga na direção daquilo que te traga entusiasmo. Sempre que tomei as minhas decisões a partir desse olhar, tive resultados muito positivos e com menor taxa de desistência -X
Amei receber essa sua news. Eu acho que sofri com uma questão por longos anos exatamente porque não me permiti desistir dela. Hoje acredito que, tão importante quanto saber investir em algo, é saber desistir quando esse mesmo algo não tá funcionando. Beijos!