Se a gente espera que amizade tenha um engajamento igual um post, isso não é amizade.
Por que estamos levando o conceito que as redes usam sobre fazer amigos para o mundo real?
Talvez esse seja um pedido de desculpas às minhas amizades, em forma de newsletter. Não só um pedido de desculpas, mas uma forma de entender uma fase de nossas vidas. Acredito que o que aqui irei narrar não há uma restrição de idade, mas talvez, seja diretamente ligado aos tempos em que vivemos.
Bom dia, boa tarde, boa noite queridas pessoas da internet que me leem
Estamos aqui hoje para pensar: como a gente aprofunda relações? Por que parece que as amizades/relações hoje funcionam igual ao algoritmo das redes sociais? Será que elas ao invés de promover conexões, nos afastaram?
Por conta das intempéries da vida, desde o início do ano, tenho estado mais offline, ou melhor dizendo e talvez seja a forma mais correta de definir: desligado. Sim, desligado, a cabeça em outro lugar, em outras preocupações, com outra prioridade. O rio ao qual me banhei no ano passado, de fato, não é o mesmo já há muito tempo. Não que isso seja ruim, é apenas diferente.
A grande questão aqui é que surgiram consequências por estar desligado, uma delas é que eu posso estar sendo interpretado como um péssimo amigo.
Hoje, o tempo médio da experiência de usuário ao conversar comigo, pelo WhatsApp, é de mais de 1 dia kkkkkkkk. Não é intencional, apenas muitas outras coisas tem acontecido, MAS, o segundo grande ponto aqui é: eu não deixei de ser amigo dos meus amigos, é apenas uma fase — oks, que tá sendo meio longa? siam, mas acontece.
Será então que as amizades estão iguais um stories, passou das 24h ela some?
Há quem diga que quem muito se ausenta, uma hora deixa de fazer falta. Mas, será? Acho que existem contextos, contextos e contextos. Cada caso e cada variante precisa ser analisada.
Por mais que eu demore a responder meus amigos, bom, naquele tempo que eu dispus a respondê-los, dei tudo de mim. Mandei mensagens, áudio, expliquei fatos, conjecturas e ainda contei fofocas. Mas ainda paira uma culpa sobre mim, ainda tem uma reminiscência de “mal fala com a gente”.
Particularmente, não sei como eliminar este sentimento. Penso muito que toda essa urgência é um resultado do uso da internet enquanto plataforma de comunicação de trocas rápidas. Se eu não te responder em X tempo, é quase um atestado de descaso, inimizade e até ódio.
Engraçado como todo o consumo de conteúdo, mensagens e afins, pelas redes, acabaram com o tédio das relações. Parece que hoje todas essas relações precisam se dar de forma rápida, intensa, mas tem que te preencher, ouvir, divertir, curtir, comentar, compartilhar, entreter & se seu amigo for empreendedor, você ainda tem que ser influenciador da marca dele.
Parece que esse é o algoritmo das relações atuais. E se você não cumprir esses requisitos, você não vai aparecer na for you da vida real. Porque, mais uma vez, quem não é visto…
E o tédio das relações, cadê?
Em um passado não muito distante, eu ainda lembro que era normal ter esse tédio nas relações. Quantas e quantas vezes não fui pra casa de amigas e ficamos meio a toa, sem falar nada, apenas sendo? Existiam momentos de silêncio, o conforto numa situação que hoje parece totalmente desconfortável.
Parece que atualmente precisa ter um barulhinho de TV ligada, um ASMR, um lo-fi pra poder amarrar tudo. A gente não se permite mais se entediar. As vezes queria ser do IBGE e fazer algumas perguntas pras pessoas, levantar pesquisas de comportamento. Uma das primeiras perguntas seria sobre se sentir confortável em silêncio com outras pessoas.
Dentro dessa pesquisa qualitativa, já obtive uma resposta kkkkk Meu namorado me respondeu que se sentia confortável em silêncio com a família dele. Pra mim, essa foi uma resposta incrível, porque me abriu para mais questionamentos e o principal foi: por que normalizamos o tédio nas relações familiares, mas em relações de amizades e conjugais não?
Será que é por a família ser a base de tudo? Amor incondicional? O tempo amalgamou as relações? Não sei, mas essa foi uma questão muito boa a se pensar.
Acho que alguns pontos precisam estar bem definidos na nossa cabeça:
A gente tem que aprender a se abrir pro outro;
A gente tem que aprender a confiar nos outros;
A gente tem que aprender a normalizar possíveis frustrações.
Existem alguns outros pontos como aprender sobre o tempo dos outros e empatia, mas isso eu falo já, deixa eu prosseguir aqui.
Um fato que tenho presenciado recorrentemente quando falamos de amizade no Instagram da Contente é que as pessoas sempre falam de não confiar mais no outro, porque vamos nos decepcionar, vamos nos expor a dores e tudo o mais. Mas as relações sempre são passíveis de te causar uma dor. E não, aqui não entram relacionamentos tóxicos que só nos causam dor, estou falando de relações saudáveis. Em algum momento desses quase 5 meses, meus amigos podem me dizer que fui tóxico, relapso ou coisa do tipo, porque não cumpri com certas expectativas que se estabeleceram em outros tempos e outros contextos.
E aqui entra o tópico empatia e tempo dos outros.
Nem eu mesmo, que aqui vos escreve essa missiva digital, respeitei o tempo e a vida dos outros, não fui empático o suficiente, e o pior, não respeitei que as pessoas têm o seu espaço e momento! Para vocês verem, comentei com a diva pop Ylanna sobre uma amiga que não respondeu há uns dias. Depois que pensei no tema dessa news, quase me estapeei, achei bem hipócrita de minha parte — hablei que só e depois vim aqui “me defender” sobre não responder os outros kkkkk.
A gente sempre fala de rede de apoio, particularmente, acredito que sem os outros não somos ninguém. Tudo que aprendemos veio de alguém, nunca nos construímos sozinhos. E ainda assim, a gente não entende que as pessoa tem a vida delas também, nem sempre elas estarão ao nosso lado, nem sempre elas nos farão aquele favor, mas isso não as faz menos nossas amigas.
Mas e afinal, como a gente consegue fazer e manter amizades/relacionamentos?
Essa news foi sendo construída na minha cabeça a partir de alguns fatos, como mencionei. O terceiro e mais importante foi uma reunião da Comunidade Contente.
Faço encontros com a comunidade só para hablar mesmo, sobre muitos assuntos, nada amarrado e ali é que existe o verdadeiro ouro de fazer e pertencer a uma comunidade.
Em um determinado momento, a gente falou sobre essa construção de relações. Quem tava ali foi muito aberto, falou que pensou duas vezes antes de entrar, porque enfim, querendo ou não, se conectar com os outros, ouvir, trocar, dá trabalho. E isso é super normal mesmo, só que esse é o último grande ponto deste texto: é preciso se esforçar para fazer e manter relacionamentos. Depois quando narrei o encontro pra Luiza, ela falou sobre hoje não querermos sentir dores, não queremos que exista uma “fricção” nas nossas vidas.
Na hora que ela falou isso, imediatamente pensei, mais uma vez, nas redes sociais. Todo o rolar de feed e experiência de uso é para termos satisfação e prazer. Se eu não gostei do que a pessoa X falou, arrasta para cima, o conteúdo da pessoa Y não é legal, arrasta pra cima de novo. Na vida real, a gente não tem essa possibilidade de fuga, a gente precisa lidar com o diferente, a gente vai ouvir coisas fora da nossa bolha. Por isso é tão difícil se conectar com outras pessoas.
Agora vou longe, hein, longe — se preparem! Mas parece que hoje a gente tudo é pensado em uma lógica de engajamento, a gente não constrói relações, e o fato de malhação sair da programação da TV aberta mostra exatamente isso.
Oooooi? Malhaçaum?
O que uma coisa tem a ver com a outra? Bom, eu te explico: vi esse vídeo dessa diva do TikTok, recomendo que vejam também, mas basicamente ela explica que Malhação, que era uma novela voltada ao público adolescente, acabou porque a novela conversava com outro público e não puxava a audiência para a nova delas 18h.
Parece meio impressionante que tudo precisa funcionar em uma lógica de uma coisa precisa engajar a outra, sempre o lucro, sempre a atenção, sempre a performance — e isso até mesmo para as amizades e relacionamentos.
Nosso amigo Wes, lá da comunidade, na hora da nossa conversa falou sobre construir relacionamento sem ser uma performance, a gente num tá se conectando só por se conectar, pra ser amigos.
Bom, basicamente é isso.
Talvez precisamos rever como construímos nossas redes e nossas amizades. Entender os tempos, sempre empáticos e saber que estar afastado não significa uma perda, apenas um tempo de auto-análise e mudanças e que as amizades devem perdurar a essas intempéries da vida.
O que eu tô lendo, assistindo, stalkeando:
25 newsletters depois, consigo fazer uma recomendação de coisas para vocês kkkk
_ Lendo: “O perigo de estar lúcida” de Rosa Monteiro - essa é uma leitura muito recente, vai ser a leitura do Clube do Livro da Comunidade Contente. A gente decidiu semana passada essa leitura, ainda estou nas primeiras páginas, mas impactado! Se quiserem fazer parte do nosso clube, venham participar da nossa comunidade.
_ Ouvindo: “Cowboy Carter”, da Beyoncé - mesmo não estando no meu “registro de sabor”, a maior diva de todos os tempos entregou um álbum muito bem construído, meio universal e nos apresenta o estilo musical da região que ela nasceu de forma majestosa.
_ Assistindo: “X-men ‘97”, na DisneyPlus - Se você é meio nerdola que nem eu, ama X-Men, bom, vale muito a pena conferir a nova produção da Disney. Eles usaram como base o desenho de X-Men, de 1997, e estão fazendo um trabalho impecável com os nossos mutantes favoritos. O episódio da Tempestade, uuuuuh, muito bom, viralizou muito no TikTok.
Muito bom!!!