A gente sempre parece saber o que o Instagram quer da gente, mas o que a gente quer do Instagram?
Desbloqueei o telefone, cliquei em cima do app do Instagram e deletei. Não como um gesto de algo definitivo, mas como uma resposta quase que automática a um cansaço extremo dessa rede social que não sei nem quantificar o tamanho do impacto que tem na minha vida.
Em uma sessão de terapia eu estava falando sobre minha relação com o trabalho, que invariavelmente passa pelo Instagram, e estava listando meus ganhos com a rede. São muitos. A psicóloga ouviu pacientemente e retrucou: e as perdas? Senti um peso dolorido. A resposta não caberia numa sessão de terapia. Será que cabe em uma newsletter?
O Instagram foi lançado em 2010, quando eu tinha 27 anos. Já são 13 anos usando. Passei a década dos meus 30 anos cronicamente online, mesmo tendo ensaiado algumas tantas saídas e outros tantos detox digitais.
Tudo começou de forma mágica. Eu estava encantada não só pelo meu olhar fotográfico para o mundo, mas pelo de todas as pessoas também. Essa paixão nos fez criar um projeto que exaltava esses olhares e que mudou radicalmente minha vida. Um despretensioso projeto, um plano B, se tornou protagonista, fonte de renda, reconhecimento e tantas alegrias.
Passado algum tempo, somente fotos “instagramáveis” – e todo mundo sabe bem o que é isso – deixaram de ser o suficiente. Essa rede social passou a desejar algo muito mais caro: quem somos por dentro. Foi assim que começamos a compartilhar, com vulnerabilidade, crenças, relações, visões de mundo. O que acontecia em nossas vidas não era só uma etapa na história. Era também algo a ser compartilhado. No meu caso isso, também, foi muito especial no começo. “Obrigada por compartilhar”, “achava que só eu me sentia assim” são frases que já li muitas vezes vindas do outro lado da tela e que sempre trouxeram conforto para meu coração.
Mas, assim como o olhar instagramável molda as imagens à nossa volta – a gente sempre quer tirar uma baguncinha do foco, se ajeitar um pouco mais – esse mesmo olhar passa, de certa forma, a moldar também a história de quem se propõe a compartilhá-la. Eu sempre elaborei minha própria vida escrevendo, mas será que parte disso deveria se tornar público? E se a resposta for sim (porque sei que genuinamente gosto de compartilhar meus processos) seria o Instagram o melhor formato?
Por conta do meu trabalho, converso com inúmeras pessoas sobre essa rede, damos um curso sobre criação nessa plataforma e escuto de tantas pessoas criativas que seus olhares e suas mentes estão sequestradas pelo formato imposto, que sempre segue a trajetória do algoritmo:
antes buscando a imagem mais instagramável,
depois, o textão mais vulnerável,
agora, a mensagem que vai caber em um vídeo o mais ágil possível.
Enquanto criativos, nos sentimos frustrados. Doamos nossas forças criativas para um feed que nos dá segundos de audiência a cada tacada. No melhor dos casos, ganhamos reconhecimento, mas nem isso tem garantido o ganha pão dos criadores, que têm uma das lógicas mais perversas de trabalho. Quem cria conteúdo tem que trabalhar dia após dia, tendo cliente ou não, tendo demanda ou não, tendo saúde mental ou não. #ainternetqueagentequer tem que ser mais do que isso.
A gente expôs nossa vida demais
Criou conteúdo demais
E isso nos afastou e nos esgotou
E agora?
Enquanto não tenho a resposta de milhões, ensaio alternativas. Como comecei contando, deletei o app do meu telefone. Mas não, ainda não sou uma das pouquíssimas privilegiadas que poderá abandoná-lo. Minha nova tentativa de uso é a seguinte:
Baixo e instalo o aplicativo somente quando tenho algo para postar no feed ou nos stories. Assim que publico, deleto de novo. Esse processo de deletar e reinstalar dura segundos. O resto do tempo, uso somente pelo computador. No desktop, pasmem, o Instagram é ZERO viciante. Passo poucos minutos por dia ali. Abro, vejo as mensagens, uns quatro ou cinco stories, alguns posts no feed e é isso. No computador eu tenho a oportunidade de fazer algo que me foi roubado quando usava o app no telefone: a de entrar e a de sair da rede social. Quando eu fecho o computador acabou, só no dia seguinte.
Desde que fiz isso achei surpreendente perceber que ganhei um tanto do foco que eu considerava que havia perdido, somente por ter desinstalado o app do telefone. Quando bate uma angústia no meio de uma escrita ou leitura mais complexa, eu ainda posso trocar de abas e dar uma escapada para o Insta. Mas no desktop essa escapada é tão mais breve que no celular que é até constrangedor quantificar.
Agora um pequeno parênteses:
Preciso contar que no dia que aconteceu a cena que eu descrevo no início do texto (o ímpeto de parar de usar o app no telefone) rolou o seguinte: meu filho de três anos estava na sala brincando e me pediu um copo de água. Eu fui buscar e, no meio do caminho, desbloqueei o telefone, “rapidinho”, sabe? Um tempinho depois, ele veio atrás de mim e me perguntou, com um genuíno estranhamento:
“Mãe, o que você está fazendo parada aí no meio da cozinha com o telefone na mão?”
E essa pergunta me acordou – não havia resposta possível. Como disse Dani em uma coluna recente, não quero ser um zumbi de telefone na mão. E, mais do que isso, sendo mãe eu não posso ser um zumbi de telefone na mão. Que força terá a minha voz quando chegar a hora de fazer combinados sobre o uso dele das telas? E que exemplo eu vou dar pra ele se eu for essa pessoa?
Para encerrar, o que eu tenho pensado é que a gente sempre parece saber o que o Instagram quer da gente, mas, o que a gente quer do Instagram?
Essa resposta é muito mais complexa do que um Reels de 15 segundos. E é a pergunta a qual tenho tentado responder. Você sabe?
Entendo totalmente, e no meu caso mudei o ícone do app pra última tela, dentro de uma pastinha quase escondida, e no lugar em que ele costumava estar coloquei um app de meditação. Advinha quem às vezes se dá conta de que abriu o app de meditação e não sabe por quê? O vício das redes... Realmente identificá-lo e tomar qualquer pequena atitude para diminui-lo é a atitude mais bonita que podemos ter com nós mesmas, pra nos devolver a vida pré-zumbinstagramers...
uma forte tendência pra 2024 que tenho visto bastante é o abandono de redes como o instagram, sendo substituído por redes como o substack por exemplo. uma saída pra compartilharmos e consumirmos conteúdos mais relevantes e que de fato, nos interessem e contribuem pro nosso crescimento pessoal! espero que se materialize mesmo!