#12 Eu não quero emburrecer (mas talvez isso já esteja acontecendo)
O ano começou de verdade agora, depois do Carnaval. E agora? Hora de olhar para os planos traçados ali naquele mapa dos sonhos, feito ainda em janeiro. Uma atividade simples, mas tão poderosa: de colocar no papel os desejos como se eles já tivesse acontecido. Em vez de "quero comprar uma casa", "me vejo morando numa casa linda, de frente para o mar", sabe?
Entre os meus desejos, veio forte uma vontade de voltar a estudar. De maneira mais formal, com um compromisso assumido por mais tempo. Há quanto tempo não faço isso?
Tenho pensando na vida como um grande bloco de tempo. Ando falando "isso aconteceu há 20 anos" – e me surpreendendo como o tempo passa tão rápido. Quando a gente vê, virou uma geriatric millennial que, sim, adora uma torrada com abacate no café da manhã… E sente falta de estar mais ativa intelectualmente também.
Lembro de um tempo em que eu e a Lu fazíamos viagens que eram imersões em conhecimento. Primeiro, passamos um mês em Nova York, em 2013. Andávamos a cidade toda, íamos a dezenas de museus e galerias, comíamos em restaurantes deliciosos. Fazíamos umas compras também, porque era aquela época do dólar a uns R$ 2 (saudades). Conversávamos o dia inteiro, tínhamos ideias maravilhosas, algumas das quais ganharam a luz do dia.
Depois, fomos ao Vale do Silício, conhecer de perto as gigantes da tecnologia e também players menores, mas com a mesma mentalidade de que realizar e colocar no mundo são as chaves para ter projetos bem sucedidos, mesmo que até lá você falhe bastante. Aliás, uma frase que me lembra muito essa viagem é "fail fast, fail better", algo como fracasse logo para fracassar melhor. Essa viagem nos mostrou que nosso então projeto principal, o @instamission, era gigante. Teve até investidor querendo conversar mais com a gente – e eu penso porque não nos jogamos nessa oportunidade.
Em 2015, fomos estudar na Schumacher College, na Inglaterra. Fizemos um curso chamado "Liderança para a transição", que mais parecia um TED Talk ao vivo, com mentes brilhantes nos convidando a refletir sobre quais impactos nosso trabalho poderia ter no mundo. Isso nos mudou para sempre. Ficou impossível pensar apenas na #ainternetqueagentequer, passamos a refletir e atuar para criar também #omundoqueagentequer.
Um pouco depois, fizemos uma formação com a Gaia Education, em que aprendemos muito sobre sustentabilidade e regeneração. Esse foi massa porque foi mais longo, então tinha o compromisso de ficar com os assuntos por um tempo, sabe?
De lá pra cá, fiz mais vários cursos livres, principalmente de escrita criativa. Sempre gosto de manter minha cabeça em movimento. Mas me dei conta, na virada do ano, como tenho sentido falta de estudar algo por um tempo mais longo. Isso aconteceu também porque precisei atualizar o meu currículo, algo que não fazia há muitos anos, e senti falta de ter alguns títulos para colocar ali. O que me faz pensar que não importa o que a gente faça, a gente sempre acha que poderia fazer mais. Claro que me pego pensando: caramba, poderia ter feito mais nesse meio tempo. Mas esse não é um texto sobre como a autocobrança parece que vem acoplada a nós mulheres. Então voltemos ao que interessa.
Eu quero voltar a estudar porque quero assumir um compromisso comigo mesma. Sou tão boa em encher a agenda com atividades, em cultivar as amizades com tempo, em organizar a casa, em fazer tanta coisa. Mas faz muito tempo que eu não dedico um tempo para estudar algo por um tempo.
Sinto meu cérebro meio atrofiado em alguns momentos. E posso, claro, culpar a dinâmica das redes sociais por isso. Quem aí consegue se concentrar por um tempo mais longo? Quem troca as páginas de um livro pelo scroll infinito? A gente sabe que tá difícil. Como é que a gente se mantém estudando quando a internet comeu nossos cérebros? Quando a internet nos distrai o tempo todo, fazendo a gente achar que está aprendendo ao consumir conteúdo em doses cavalares?
No paralelo, a inteligência artificial avança de forma exponencial (fiz um curso esses dias, me senti num curso de datilografia no século 20; a gente vai ter que aprender a usar a ferramenta, e o quanto antes a gente se entusiasmar por isso, melhor), o que nos deixa inseguras também. Não tem sido incomum ouvir de amigos e colegas um "medo" de perder espaço no mercado de trabalho. Confesso que fazer o curso foi bom, mas me deixou com essa sensação de que estou emburrecendo. Antes eu era early adopter, adorava testar tudo de novo que encontrasse. Agora me vejo mais resistente. E não quero!
Preciso reaprender a ficar com a atenção focada, porque meu cérebro foi comido pela internet. Talvez por isso o estudar venha com força. Ainda sofro do mesmo mal da vida toda, que é ter interesses tão múltiplos que fica difícil escolher uma coisa só para fazer. Mas também me vem uma praticidade: vou escolher e começar, ver qual é, ver, principalmente, o que acontece depois de um tempo me dedicando a um assunto.
Aceito dicas, aliás, de como criar uma rotina de estudos que faça sentido. Você tem?
Falando em tempo de novo, penso: o que eu diria para o meu eu de 20 anos atrás? Não fique tanto tempo sem estudar formalmente. Seu cérebro se acostuma a fazer e a resolver, você vai ficar muito boa nisso. Mas uma hora você vai querer recomeçar. E você vai sentir falta de ter uma rotina estruturada, de ter o hábito mesmo. Sabe quando você faz exercício e pára e depois pra voltar é osso? Parece que acontece o mesmo com o cérebro. Eu me recuso a escrever malhar o cérebro, mas que o bichinho precisa reaprender a estudar, precisa. O que me conforta é que sou boa em me desafiar. Vamos ver o que vai ter vindo aí depois de um ano?
Texto bom pra ler numa segunda. Também sofro de múltiplos interesses, tem cura? Há 30 anos atrás, teria ficado em um trabalho que dá dinheiro, porque mudar de carreira aos 53 - desafio angustiante.
Dani, você me fez refletir sobre essa questão de o que é emburrecer, que acredito estar relacionada à sua definição do que é "estudar formalmente".
porque assim, essas "saudades" eu recebo com cautela, por minha natureza workaholic e esquecida. Esqueço dos motivos que me fez não continuar, e fica aquele sentimento tóxico de achar que a vida tá boa, então falta um pouco de desgraça (rio de nervoso com isso).
enfim, estudo formal é faculdade? ou é assumir um certo assunto?
porque o primeiro te dá um título, mas você se sente divergir do assunto o tempo todo (tipo aquele dizer que a faculdade não te deixa estudar). E o segundo, como minha orientadora uma vez parafraseou certo filósofo: a origem é definida no final do destino, quando olhamos para trás e ligamos os pontos. Algo que tenho enfrentado hoje...
Porque a gente multipotencial acha que se interessa por vários fazeres, mas não sei mais se são vários assuntos. Hoje acredito que existe um sentido, algo que justifica todas as escolhas.
Talvez o que sente falta não é escolher um assunto a estudar, mas reconhecer?
Se você é boa em planejar e manter, pode acreditar, moça... você encontrando essa peça, vai montar a rotina num instante hehehe
Espero te ajudar com isso. Obrigada por provocar essa reflexão em mim também!