Eu tentei, até. Foram muitas as vezes em que eu disse: vou fazer a Boca Rosa e mostrar meu dia a dia, contar dos bastidores do meu negócio. Além disso, vou mostrar meus looks, minha família, os lugares em que eu vou. Vou fazer um reality da minha vida. Eu juro: acordava e dizia "é hoje". No mesmo hoje já não conseguia.
Não rolou. Nem vai rolar. Habito e vivo essa internet há muito tempo. E abasteço esse espaço quando tenho o que dizer. Quando acho que alguma coisa que pensei faz sentido de ser compartilhado com mais gente. Me interessam as trocas que surgem a partir disso. O que a gente vai construindo em comunidade.
Faz um tempo, comecei a me incomodar quando me chamavam de influencer, de blogueira. Se vem de alguém próximo, pode ter certeza que o tom é meio de tiração de onda, sabe? "Olha lá ela, toda blogueirinha". Já escrevi algumas vezes sobre isso aqui. Quase nunca era de um lugar de admiração. Houve um momento até em que eu tentava mostrar a força desse lugar: sou mesmo, inclusive blogueira que tem blog, o que deveria ser óbvio mas nem é. E blogueira sim, olha que legal atingir tanta gente com o que tenho a dizer?
Não há nada mais incrível do que pensar que as redes sociais deram e dão cada vez mais espaço para as pessoas se expressarem. Quantas pessoas incríveis conhecemos nos últimos tempos? Quantas pessoas com realidades completamente distintas ascenderam graças ao poder do Instagram, do TikTok? A creator economy fez muita gente mudar de vida e, principalmente, democratizou a cara dessa internet. Poderia listar alguns nomes que mudaram a cara da internet brasileira, mas seria injusto com todos que ficariam de fora. Ainda assim, agradeço a cada um deles que fez da internet um espaço muito mais plural nos últimos anos.
Por outro lado, essa mesma internet foi inundada por jogo do tigrinho, bets, estímulo ao consumo desenfreado, discurso de coach (que inclusive abala a política). Gente que ostenta estilos de vida inalcançáveis, mas fazem isso com aquele senso de proximidade, do tipo "se eu consegui, você também consegue". Um horror, um perigo, uma falta de responsabilidade. Um jogo terrível com a vulnerabilidade alheia – e com as saúdes financeira e mental também.
No fim do dia, quando falamos de influenciadores, qual tipo tem mais destaque? O que sai no jornal é a influenciadora presa, o outro que vendia produtos adulterados. O que fica na boca do povo quando esse termo é usado é que tipo de gente? Para quem não faz parte desse universo, influencer podemos ser eu, você e também quem faz seus seguidores apostarem o que não têm naquilo que nunca vão ganhar.
Então, ou a gente muda o nome da categoria em que eles são colocados, ou a gente sai dessa mesma categoria. Poderíamos falar criminosos, pilantras, aproveitadores. Enquanto não dá, bora olhar para quem faz das redes sociais plataformas para as suas criações de outra coisa. Gente que faz #ainternetqueagentequer, por exemplo. Jornalistas, pesquisadores, podcasters, artistas, músicos…
Esta semana eu anunciei o lançamento do meu livro. A vida inteira eu quis escrever um. Consegui, e agora é real! No mesmo dia, encontrei uma pessoa que falou: soube que você é influenciadora, tem muitos seguidores. E eu respondi: não sou, o que mais quero, ainda mais hoje, é deixar de lado essa alcunha. Eu sou muitas coisas: jornalista, uma das criadoras da Contente, fundadora do Coletivo Dupla Maternidade. E agora, com a boca cheia de orgulho: escritora!
Influencio pessoas? Tomara que sim! Afinal, quem escreve quer ser lido. Quem usa a internet, quer ter alcance. Se algo que eu escrevi ou falei influencia de alguma forma, aí sim eu fico feliz. É isso que me move, é o que me faz acreditar que a internet é um espaço incrível, que gera trocas importantes, conexões que nos preenchem, que amplia nossa visão de mundo.
Mas, ainda mais numas semanas como essa, dispenso a alcunha influenciadora. Não dá pra ficar no mesmo balaio.
Então bora imaginar novas possibilidades, fortalecer esse grupo imenso de gente boa que faz da internet um espaço saudável, criativo, propositivo, que contribui para a saúde mental de mais gente? Gente que tem o que dizer, gente que tem valores e ética, gente que tem responsabilidade. Infelizmente, esse grupo nunca vai ter os milhões de seguidores que os trambiqueiros tem. Mas a gente resiste. E vai criando, ao compartilhar o que temos a dizer, #omundoqueagentequer também.
Excelente reflexão, Dani. Sempre pensei que influenciar automaticamente seria sobre algo positivo, uma reflexão, uma nova perspectiva, um estímulo pra mudar ou questionar o status quo. Vejo esses "influenciadores" mais como vendedores. Já criei conteúdo na internet e justamente por não me identificar mais com essa alcunha e pelo cansaço mental que era brigar contra o sistema que só valoriza notícias absurdas que larguei mão. Parabéns pela conquista do livro e por fazer da internet um espaço de reflexões e debates saudáveis. Admiro mto sua jornada. Um abraço!
Essas palavras vão longe, porque tenho visto cada vez mais creators em busca de espaço seguro e motivação pra criar além da obrigação. A frase “abasteço esse espaço quando tenho o que dizer. Quando acho que alguma coisa que pensei faz sentido de ser compartilhado com mais gente.” Resume esse sentimento, texto inspirador.